Papa encerra sua primeira viagem com conselhos para quem se sente sobrecarregado.
02/12/25
A paz é um caminho, não apenas um
objetivo, disse o Papa ao deixar o Líbano após três dias de grande entusiasmo,
plantando esperanças de um futuro melhor.
As imagens destes dias no Líbano provavelmente
ficarão na memória do Papa Leão XIII — e do mundo — por muito tempo. As
milhares de pessoas alinhadas em cada rota, os sorrisos e aplausos
intermináveis, as lágrimas... quando um povo sofreu tanto, a intensidade da
alegria parece quase surpreendente. Por que tanto entusiasmo? Ou talvez mais do
que porquê... como ?
O Líbano ocupa um lugar especial no coração do Papa
há várias décadas. É, como gostam de repetir, mais do que uma nação. É uma
"mensagem" — uma mensagem de que a coexistência é possível. De que as
diferenças não precisam degenerar em violência.
ANDREAS SOLARO | AFP
Mas será que o Líbano pode voltar a ser essa
mensagem, para si próprio, para o Médio Oriente e para o mundo inteiro?
Após o sofrimento dos últimos anos, especialmente
simbolizado pela misteriosa explosão no porto que matou mais de 200 pessoas em
agosto de 2020, e que o Papa visitou esta manhã, o caminho a seguir é difícil.
DIVULGAÇÃO | AFP
Na missa desta manhã, seu último evento público, o
Papa Leão XIII sugeriu que a chave para construir um futuro melhor está no
caminho da gratidão, mesmo quando "paralisados pela impotência diante do mal e oprimidos por tantas situações difíceis"... uma
gratidão que manterá a esperança viva e fortalecerá a coragem.
Segue o texto completo de sua homilia e um apelo
que ele fez ao final da missa.
Queridos irmãos e irmãs!
Ao final destes dias intensos, que compartilhamos
com alegria, agradecemos ao Senhor pelas muitas dádivas de sua bondade, por sua
presença entre nós, pela Palavra que nos oferece abundantemente e por nos
permitir estar juntos.
Como acabamos de ouvir no Evangelho, Jesus também
teve palavras de gratidão ao Pai e, voltando-se para Ele, orou: “Eu te louvo,
Pai, Senhor do céu e da terra” ( Lc 10,21).
Contudo, o louvor nem sempre encontra espaço dentro
de nós. Às vezes, sobrecarregados pelas lutas da vida, preocupados com os
inúmeros problemas ao nosso redor, paralisados pela impotência diante do mal e oprimidos por tantas situações difíceis, somos mais
inclinados à resignação e ao lamento do que à admiração e à gratidão.
Querido povo do Líbano, convido-vos a cultivar
sempre uma atitude de louvor e gratidão. Vós sois os recipientes de uma rara
beleza com que o Senhor adornou a vossa terra. Ao mesmo tempo, sois testemunhas
e vítimas de como o mal, nas suas diversas formas, pode obscurecer esse
esplendor.
Foto de Handout / VATICAN MEDIA / AFP
Desta esplanada com vista para o mar, eu também
posso contemplar a beleza do Líbano, cantada nas Escrituras. O Senhor plantou
aqui os seus altos cedros, nutrindo-os e regando-os (cf. Sl 104,16). Ele fez com que as
vestes da noiva no Cântico dos Cânticos exalassem o perfume desta terra (cf.
4,11), e em Jerusalém, a cidade santa revestida de luz para a vinda do Messias,
anunciou: “A glória do Líbano virá a ti, o cipreste, o plátano e o pinheiro,
para adornar o lugar do meu santuário; e glorificarei o lugar onde repousam os
meus pés” ( Is 60,13).
Essa beleza, porém, é ofuscada pela pobreza e pelo
sofrimento, pelas feridas que marcaram a sua história. A propósito, visitei o porto para rezar no local da explosão .
A beleza do seu país também é ofuscada pelos muitos problemas que o afligem,
pelo contexto político frágil e frequentemente instável, pela dramática crise
econômica que pesa sobre ele e pela violência e conflitos que reacenderam
antigos temores.
Em tal cenário, a gratidão facilmente dá lugar à
desilusão, os cânticos de louvor não encontram espaço na desolação do coração e
a esperança se esvai diante da incerteza e da confusão.
A palavra do Senhor, porém, nos convida a encontrar
as pequenas luzes brilhantes no coração da noite, tanto para nos abrirmos à
gratidão quanto para nos impulsionar a um compromisso comum em prol desta terra.
GIUSEPPE CACACE | AFP
Como ouvimos, a razão pela qual Jesus dá graças ao
Pai não é por suas obras extraordinárias, mas porque Ele revela sua grandeza
especificamente aos pequeninos e aos humildes, àqueles que não chamam a
atenção, que aparentemente pouco ou nada contam e não têm voz. O Reino que
Jesus vem inaugurar é marcado, de fato, pela própria característica descrita
pelo profeta Isaías: é um renovo, um pequeno ramo que brota de um tronco
(cf. Is 11,1).
É um pequeno sinal de esperança que promete renascimento quando tudo o mais
parece estar morrendo. De fato, a vinda do Messias foi anunciada na pequenez de
um renovo, porque Ele só pode ser reconhecido pelos pequeninos, por aqueles que
humildemente sabem reconhecer os detalhes e vestígios ocultos de Deus em uma
história aparentemente perdida.
É também um sinal para nós, para que tenhamos olhos
capazes de reconhecer a pequenez do rebento que emerge e cresce mesmo em meio a
um período doloroso. Mesmo aqui e agora, podemos ver pequenas luzes que brilham
na noite, pequenos rebentos que brotam e pequenas sementes plantadas no jardim
árido desta era da história. Penso na vossa fé sincera e genuína, enraizada nas
vossas famílias e nutrida pelas escolas cristãs. Penso no trabalho constante
das paróquias, congregações e movimentos para atender às perguntas e
necessidades do povo. Penso nos muitos sacerdotes e religiosos que se dedicam à
sua missão em meio a tantas dificuldades, e nos leigos dedicados às obras de
caridade e à promoção do Evangelho na sociedade. Por estas luzes que se
esforçam por iluminar a escuridão da noite, e por estes pequenos e invisíveis
rebentos que, no entanto, abrem esperança para o futuro, hoje unimo-nos a Jesus
para dizer: “Louvado sejas, Pai!” Agradecemos-te porque estás conosco e não nos
deixas vacilar.
Ao mesmo tempo, essa gratidão não deve permanecer
uma consolação introspectiva e ilusória. Ela deve nos conduzir a uma
transformação do coração, uma conversão de vida e à compreensão de que Deus nos
criou precisamente para vivermos à luz da fé, na promessa da esperança e na
alegria da caridade. Consequentemente, somos todos chamados a cultivar esses
brotos, a não nos desanimarmos, a não cedermos à lógica da violência e à
idolatria do dinheiro, e a não nos resignarmos diante da disseminação do mal.
ANDREAS SOLARO | AFP
Todos devem fazer a sua parte e devemos unir
esforços para que esta terra possa retornar à sua antiga glória. Desarmando
nossos corações, esse é o único caminho. Deixemos de lado as armaduras de
nossas divisões étnicas e políticas, abramos nossas confissões religiosas ao
encontro mútuo e reacendamos em nossos corações o sonho de um Líbano unido. Um
Líbano onde reinem a paz e a justiça, onde todos se reconheçam como irmãos e
irmãs e, finalmente, onde as palavras do profeta Isaías se cumpram: “O lobo
viverá com o cordeiro, o leopardo se deitará com o cabrito, o bezerro e o leão
pastarão juntos” ( Isaías 11:6).
Este é o sonho que te foi confiado; é o que o Deus
da paz coloca em tuas mãos. Líbano, levanta-te! Sê um lar de justiça e
fraternidade! Sê um sinal profético de paz para todo o Levante!
Irmãos e irmãs, eu também gostaria de repetir as
palavras de Jesus: “Eu te louvo, Pai”. Elevo minha gratidão ao Senhor por ter
compartilhado estes dias com vocês. Enquanto levo em meu coração seus
sofrimentos e esperanças, oro para que esta terra do Levante seja sempre
iluminada pela fé em Jesus Cristo, o sol da justiça. Oro também para que, pela
graça de Cristo, o Líbano persevere nessa esperança que não decepciona.
JOIA SAMAD | AFP
_________________
Apelo ao final da Santa Missa
Caros
irmãos e irmãs,
Durante esses dias da minha primeira Viagem Apostólica ,
realizada neste Ano Jubilar , quis vir como peregrino de
esperança ao Oriente Médio, implorando a Deus o dom da paz para esta terra
amada, marcada pela instabilidade, guerras e sofrimento.
Queridos cristãos do Levante, quando os resultados
dos seus esforços pela paz demorarem a chegar, convido-vos a erguer o olhar
para o Senhor que está chegando! Olhemos para Ele com esperança e coragem,
convidando todos a trilhar o caminho da convivência, da fraternidade e da paz.
Sejam artífices da paz, arautos da paz, testemunhas da paz!
O Oriente Médio precisa de novas abordagens para
rejeitar a mentalidade de vingança e violência, superar as divisões políticas,
sociais e religiosas e abrir novos capítulos em nome da reconciliação e da paz.
O caminho da hostilidade mútua e da destruição no horror da guerra já foi
percorrido por tempo demais, com os resultados deploráveis que estão diante dos olhos de todos. Precisamos mudar de
rumo, precisamos educar nossos corações para a paz.
Desta praça, oro pelo Oriente Médio e por todos os
povos que sofrem por causa da guerra. Ofereço também orações de esperança por
uma solução pacífica para os atuais conflitos políticos na Guiné-Bissau. E não
me esqueço das vítimas e de suas famílias no incêndio em Hong Kong.
Rezo especialmente pelo amado Líbano! Peço, mais
uma vez, à comunidade internacional que não poupe esforços na promoção de
processos de diálogo e reconciliação. Dirijo um apelo sincero àqueles que detêm
autoridade política e social, aqui e em todos os países marcados pela guerra e
pela violência: ouçam o clamor de seus povos que clamam pela paz! Coloquemo-nos
todos a serviço da vida, do bem comum e do desenvolvimento integral das
pessoas.
Finalmente, a vocês, cristãos do Levante, cidadãos
destas terras em todos os sentidos, repito: tenham coragem! Toda a Igreja olha
para vocês com carinho e admiração. Que a Bem-Aventurada Virgem Maria, Nossa
Senhora de Harissa, os proteja sempre.

Edição Inglês







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