As amizades podem se desenvolver no trabalho?
10/07/25
Podemos trabalhar entre amigos? Um
vínculo de confiança compartilhada pode se tornar uma alavanca positiva no
cerne da atividade profissional, acredita o filósofo Pierre d'Elbée, consultor
de negócios. No entanto, a transparência radical não é possível nem desejável.
Muitas aventuras empreendedoras começaram com
amizades. Os irmãos visionários André e Édouard Michelin construíram um império
industrial com base em sua solidariedade inabalável. Bill Hewlett e Dave
Packard personificaram uma liderança baseada na confiança, simplicidade e uma
visão compartilhada. Por outro lado, inicialmente unidos por uma forte amizade,
Steve Jobs e John Sculley vivenciaram um rompimento brutal com
profundas consequências para a Apple. Esses exemplos mostram que a amizade no
local de trabalho pode ser um ponto forte — ou um ponto fraco. Devemos ter
cuidado com ela ou cultivá-la? Podemos — e devemos — trabalhar com amigos? A
questão vai além do pragmatismo: ela toca em nossa concepção de conexão humana
nos negócios e no mundo do trabalho: uma ferramenta funcional ou um
relacionamento significativo?
Uma empresa não é um mundo abstrato de funções, mas
uma comunidade de pessoas. Em tempos de crise, pressão ou transformação, os
relacionamentos se revelam e podem se aprofundar. Não se trata mais apenas de
fazer bem o próprio trabalho, mas de se manter unido, apoiar os outros e se unir
em nome de uma lealdade que vai além dos contratos. Nesses momentos, a
colaboração se torna mais próxima, mais duradoura. É na adversidade que a
confiança se constrói — e, às vezes, nasce a amizade.
Transparência
privada e discernimento profissional
Em sua Doutrina
da Virtude , Kant dá uma definição exigente de amizade: "A
amizade (tomada em sua perfeição) é a união de duas pessoas por amor e respeito
iguais e recíprocos. [...] Ela requer total confiança entre amigos: cada um
deve ser capaz de abrir seu coração ao outro, não apenas em seus sentimentos,
mas também em seus julgamentos secretos." A amizade privada descrita por
Kant é baseada na transparência total: a liberdade interior e a confiança
"completa" criam uma segurança emocional onde cada um pode contar
tudo ao outro sem medo. Mas no mundo profissional, essa transparência radical
não é possível nem desejável. Não por falta de ética, mas por prudência. A
amizade profissional não se baseia na transparência total, mas em um
compartilhamento justo e equilibrado de informações úteis. O que importa não é
dizer tudo, mas dizer o que permite ao outro agir, sem expô-lo ou
sobrecarregá-lo.
Algumas decisões estratégicas exigem discrição, não
por desejo de ocultar informações, mas porque afetam o bem comum e exigem um
prazo específico ou confidencialidade. Aqui, não é a transparência que garante
a qualidade do relacionamento, mas a confiança no discernimento mútuo. Assim,
enquanto a amizade privada tende à intimidade por meio da verdade
compartilhada, a amizade profissional busca a confiabilidade por meio da
responsabilidade assumida. O critério não é "dizer tudo", mas
"dizer a coisa certa" — isto é, tudo o que for necessário para que,
em seu nível, a pessoa em questão exerça sua responsabilidade com pleno conhecimento
de causa.
Do
serviço prestado ao vínculo de amizade
Onde a
priori impera uma lógica contratual, a amizade pode nascer entre um
cliente e seu prestador de serviços. Tudo começa com a confiança: em resposta a
uma necessidade expressa, uma missão é executada com rigor, às vezes com uma
atenção que vai além do que é devido. Em alguns casos, essa relação gera mais
do que satisfação: gera reconhecimento, gratidão. Passamos então da justiça (o
que é devido) à humanidade (o que é oferecido). Atenção sincera,
disponibilidade e excelência nos gestos podem dar origem a um respeito mútuo
duradouro.
Esse vínculo não se baseia na familiaridade, mas no
respeito mútuo, na gentileza e na reciprocidade, enraizados na experiência de
um serviço prestado e apreciado. Não se trata de instrumentalizar o
relacionamento, mas de reconhecer que a amizade pode surgir onde a qualidade do
vínculo vai além da troca formal.
Amizade
profissional: uma oportunidade?
Trabalhar com amigos ou ver uma amizade florescer no trabalho não significa introduzir a atividade profissional em uma esfera puramente emocional. Trata-se de reconhecer que um vínculo de confiança, quando compartilhado, atencioso e justo, pode se tornar uma alavanca no cerne da atividade profissional. Em um mundo profissional em busca de significado e cooperação, a amizade — em sua forma ajustada e não íntima — não é um luxo nem um perigo. É uma oportunidade. Não para abolir papéis, mas para melhor encarná-los.
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